apoio cultural poderá ser realizado por entidades de direito privado e de direito público.

terça-feira, 17 de março de 2009

Jovens querem participar da Conferência de Comunicação

16/03/2009
Carolina Paiva - Revista Viração
Observatório do direito à Comunicação


Na tarde desta quinta-feira (12), foi realizada uma reunião virtual para definir a organização da Rede de Adolescentes e Jovens Comunicadores e Comunicadoras para a I Conferência Nacional de Comunicação, que deve acontecer ainda esse ano, de acordo com declarações do presidente Lula. Participaram do chat cerca de 30 adolescentes e jovens que fazem parte de organizações envolvidas com o tema da comunicação em diferentes estados do país, como Bahia, São Paulo, Pará, Rio Grande do Norte e Minas Gerais, entre outros.
As principais ações definidas na reunião foram: pressionar por um espaço para a juventude no Grupo de Trabalho que irá organizar a Conferência; articular encontros, seminários e Conferências Municipais e Estaduais prévias à Conferência Nacional e apoiar o CONJUVE na mobilização dos jovens para participação nas conferências locais.
Uma dos principais passos dados para o apoio à realização da Conferência Nacional de Comunicação foi o lançamento de uma Carta para divulgar a Rede de Adolescentes e Jovens Comunicadores e Comunicadoras e garantir que adolescentes e jovens tenham uma participação ativa na I Conferência Nacional de Comunicação.
A Rede de Adolescentes e Jovens Comunicadores e Comunicadoras é uma iniciativa promovida pela Revista Viração. Ela iniciou seus trabalhos em abril de 2008, quando houve um primeiro encontro reunindo cerca de 60 representantes de 30 organizações juvenis que atuam com comunicação popular juvenil nos vários estados do Brasil na cidade de Brasília. A Rede está num processo de articulação e definição de sua missão, objetivos e ações. Uma das iniciativas será a mobilização de jovens visando uma participação qualificada no processo da I Conferência Nacional da Comunicação.
Leia abaixo a Carta:
A Rede de Adolescentes e Jovens Comunicadores e Comunicadoras do Brasil, uma nova articulação da juventude pelo Direito Humano à Comunicação no país, vem, por meio desta, comemorar o anúncio da I Conferência Nacional de Comunicação pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva e reforçar a importância da participação da juventude brasileira na construção de políticas públicas de comunicação no país.

A Conferência de Comunicação é urgente, visto o momento sócio-político e cultural mundial que vem sendo transformado a cada dia pela inovação tecnológica na área da informação e da comunicação, o que pode provocar situações concretas de interação entre as pessoas no mundo inteiro com princípios globalizadores que promovam a emancipação justa da diversidade cultural. Além disso, no Brasil, a concentração dos meios de comunicação de massa em poucas mãos ganha cada vez mais força e poder no uso da informação junto às imagens, provocando um sentido arbitrariamente desigual no agendamento das discussões políticas, assim como no direcionamento desses diálogos.
Para nós, jovens brasileiros e brasileiras, falar em direito à comunicação no Brasil, é, sem dúvida, falar em promover um desenvolvimento sustentável da democracia nacional. É promover o acesso aos meios de produção, propiciar estímulo e fortalecer o potencial criativo da população. É um direito inalienável, pois se trata da expressão humana que muitas vezes é adormecida em decorrência dos processos de exclusão sócio-econômica.
Acreditamos que a Comunicação é uma grande ferramenta de participação social, pois ela, aliada a processos democráticos de produção e circulação de conhecimentos, contribui de maneira decisiva para que as populações tenham assegurado os seus direitos de serem ouvidas, assim como de ouvirem uma diversidade de vozes. "... para falar sobre a democratização da produção e do uso dos meios de comunicação, temos a responsabilidade de alertar os governos de que antes de globalizar nosso discurso, temos que globalizar o acesso à informação. E se vamos unir esforços de vários povos para que isso aconteça, mais do que modificar a mídia, vamos usá-la para acabar com a violência, a miséria e o difícil acesso à educação. Unir esforços significa lutar junto à mídia para levarmos cultura, entretenimento e educação de boa qualidade para toda a população".
Com esse pensamento, adolescentes e profissionais da área construíram na IV Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes que reuniu quase 2 mil pessoas para discutir a mídia para/de/com os jovens e apresentar alternativas de inclusão digital e mobilização sócio-cultural através da comunicação, no Rio de Janeiro, em 2004, uma carta com propostas para qualificar o acesso aos meios de produção para os jovens e a programação destinada ao público infanto-juvenil no mundo inteiro.

Em processo de formação, experimentando radicalmente sensações e histórias, crianças, adolescentes e jovens merecem atenção quanto ao direito de se comunicar. A vontade latente dessas pessoas nessa fase da vida de interagir com o mundo e de transformá-lo sempre faz com que eles busquem de modo bastante significativo formas de se comunicar com o espaço e com as pessoas.
Assim, é necessário que as propostas a serem apresentadas acrescentem ainda mais representatividade, tanto legal quanto política, a essa parcela de comunicadores e comunicadoras, sempre tão excluídos dos grandes meios como em qualquer outro segmento da sociedade. Estamos aqui falando de um momento histórico nas discussões sobre o direito constitucional de produzir e consumir comunicação, pois esse pode ser o pontapé inicial para a derrocada do sistema mediático atual, baseado nos grandes conglomerados de informação, que agem como máquinas capitalistas, visando o lucro acima do direito que as pessoas têm de receber informação idônea e transparente, além de produzir a sua comunicação sobre os anseios de suas comunidade, suas experiências e vivências, de forma a compartilhar com as outras pessoas as suas dificuldades e seus acertos e vitórias.
Também é preciso que sejam discutidas propostas que visem à garantia do acesso a políticas públicas de fomento as comunicações sociais e comunitárias, seja em quais âmbitos for, garantindo assim o direito a comunicação, não apenas de consumir e produzir, mas interagindo com outros produtores / consumidores e formando alianças e parcerias que visem o desenvolvimento de um sistema de informação alternativo, que bata de frente com o modelo baseado no capital especulativo e no objetivo de lucro, que é praticado pela totalidade dos meios comerciais atualmente.
Para tanto, é necessário que, além das discussões sobre o acesso a comunicação, sejam constituídos meios reguladores efetivos para as concessões de rádio e TV, se baseando nos princípios da nossa carta maior, a Constituição do Brasil, que é totalmente desrespeitada nesse ponto específico. Ao propor esses meios, deve se ter cautela para não cair no contraponto da censura, o que seria um retrocesso às vitórias que conquistamos durante anos de luta por uma media igualitária e livre. Isso prova que a necessidade de discutir e propor idéias para democratizar o acesso à comunicação no país também passa por uma questão edificante da perspectiva do público infanto-juvenil, que com criatividade, capacidade imaginativa e sensibilidade para as questões do mundo se comunicam o tempo inteiro e chamam atenção por onde passam por serem muitos, inquietos, em movimento.

Rede de Jovens Comunicadores e Comunicadoras

domingo, 15 de março de 2009

MOVIMENTO AVANÇA NO JUDICIÁRIO

13/03/2009

Em audiência realizada no ultimo dia 12 de março em Passo Fundo, que contou com a presença do Diretor do Departamento de Outorgas de Serviço de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações Sr. Carlos Alberto Freire Resende, do Superintendente Regional da ANATEL Sr. João Jacob Bettoni, Abraço – RS e Entidades mantenedoras de Rádios Comunitárias de diversas regiões do Rio Grande do Sul o Procurador da República da Comarca de Passo Fundo Dr. Pedro Rosso determinou que a ANATEL não poderá realizar, nos municípios que compõe a Comarca de Passo Fundo, ato de fechamento, apreensão de equipamentos, prisão ou qualquer outro ato repressivo quando esta estiver no ar após passados 180 dias da entrada do processo de outorga no da CEJUR do Ministério das Comunicações, cabendo somente autuação para defesa em prazo de 60 dias.
Essa ação do Ministério Público Federal de Passo Fundo, somadas a outras resoluções do Judiciário vem se constituir em importante vitória para o Movimento Pela Democratização do Meios de Comunicação e das Rádios Comunitárias garantindo o direito a comunicação e apontando o fim dos atos repressivos da ANATEL contra o patrimônio e a integridade das comunidades organizadas em torno de entidades e rádios.
Para o Coordenador Estadual da ABRAÇO-RS, Clementino Lopes, este avanço também no judiciário demonstra que a luta para democratizar a comunicação é cada vez mais legítima e necessária, com estas decisões judiciais, demonstrações das comunidades e a constante legitimação do movimento por parte da sociedade e das instâncias públicas a luta pela liberdade de funcionamento das rádios comunitárias aponta agora para avançar inclusive na ampliação da lei com o aumento dos canais disponíveis, anistia aos militantes representados em atos repressivos da ANATEL, distribuição democrática dos recursos públicos e ampliação da organização das entidades e do movimento. Segundo Clementino, estas decisão da Comarca de Passo Fundo do MPF servirá como base para representações em todo o país podendo agora esta ser apropriada pelo conjunto do movimento em todo o Brasil.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Região Sul Fluminense faz seu primeiro encontro Pró Conferência de Comunicação .

Convite aos Movimentos Sociais
Prezados(as),

O presidente Lula anunciou, no Fórum Social Mundial, a realização da I Conferência Nacional de Comunicação, uma antiga luta do Movimento pela Democratização da Comunicação. O decreto presidencial oficializando a convocação da Conferência é esperado para breve. Ele deverá ser seguido por portaria regulamentadora do Ministério das Comunicações, que detalhará calendário, etapas, organização e critérios de participação na Conferência. Entretanto, há uma proposta de calendário indicando que as etapas municipais e/ou regionais deverão acontecer até 22/06/2009, as estaduais até 15 de setembro e a nacional em dezembro (1, 2 e 3/12/2009).

A Conferência deverá ter caráter amplo e democrático, abrangendo representações do governo, da sociedade civil e empresários. Ela será nacional, mas deverá contemplar, no mínimo, etapas regionais e estaduais, quando haverá discussão do tema, apresentação de propostas e eleição de delegados. Os objetivos do evento são, dentre outros, identificar os principais desafios relativos ao setor da comunicação no Brasil, fazer um balanço das ações do Poder Público na área e propor diretrizes para as políticas públicas de comunicação.

Extremamente concentrada e tratada como mercadoria, na imensa maioria das vezes a serviço da ideologia dominante, a comunicação de massa tem sido utilizada freqüentemente como instrumento de criminalização dos movimentos sociais. Cresce, entretanto, a defesa da Comunicação como direito humano, principalmente no tocante à soberania nacional, liberdade de expressão, inclusão social, diversidade cultural e religiosa, questões de gênero, raça e opção sexual, convergência tecnológica e a regionalização da produção.

Há quase dois anos funciona a Comissão Nacional Pró-Conferência de Comunicação, com representantes de várias entidades e movimentos nacionais da sociedade civil organizada. Aqui no RJ, funciona desde o primeiro semestre de 2008 uma Comissão RJ Pró-Conferência, composta por entidades e movimentos fluminenses. É urgente e necessária a criação de uma Comissão Pró-Conferência da Região Sul Fluminense.

Até a realização das etapas da Conferência, caberá aos movimentos sociais organizados conscientizar e mobilizar a população sobre a sua importância. Esse processo, para ter sucesso, deverá envolver muito além dos profissionais e entidades ligadas à Comunicação. Ele precisará contar com a participação efetiva do conjunto da sociedade civil organizada, a maior interessada na democratização da Comunicação no país.

É com esse objetivo que convidamos a sua entidade a participar e apoiar a divulgação da reunião, promovida pelo Fórum de Mídia Livre do Sul Fluminense, que pretende reunir profissionais de Comunicação, rádios e outros veículos de comunicação comunitários e alternativos, representantes de movimentos populares, sindicais, estudantis, culturais e sociedade civil em geral da Região Sul Fluminense, e acontecerá no próximo dia 28 de março de 2009, sábado, das 14 às 18 horas, no Plenário da Câmara Municipal de Volta Redonda, sito à Avenida Lucas Evangelista, Aterrado.

Programação:
14 h - Recepção e credenciamento
14h30 - Painel: Conferência Nacional de Comunicação: o que é, quem participa e importância
Expositores: Membros da Comissão Pró-Conferência Nacional de Comunicação do RJ
15h30 - Esclarecimentos e debate
16h15 – Café
16h30 - Plenária: Mobilização dos movimentos sociais, calendário de atividades, Conferência Regional e organização da Comissão Pró-Conferência de Comunicação do Sul Fluminense
18h00 - Encerramento

Cordialmente, Fórum de Mídia Livre do Sul Fluminense
Contatos e mais informações pelo e-mail midiainsana@gmail.com ou pelos telefones (24) 8802-5565 - José Roberto (Maninho); (24) – 9976-7742 - Leslie; (24) 9828-1840 - Lívia; (24) 9918-2329 – Alvaro Britto.

sábado, 7 de março de 2009

Rádios Comunitárias. Um canal no dial é um bem escasso .

06/03/2009 Redação IHU Online

Entrevista Especial com Teresa Cristina Matos


Dedicada à pesquisa sobre a temática radiofônica, em especial ao estudo das rádios comunitárias no Brasil, Teresa Cristina Matos defende a regulamentação das rádios comunitárias e diz que não há espaço para todos no dial. Para ela, o projeto de Lei 4573/2009, proposto pelo governo para descriminalizar as rádios comunitárias, além de ser resultado de mobilizações pelo reconhecimento do direito à comunicação não-comercial e não estatal, “aponta uma mudança de orientação importante no tratamento dado das rádios sem licença”. De acordo com o texto encaminhado ao Congresso, algumas medidas de controle ainda permanecem e as rádios que atuarem sem permissão continuarão caracterizadas como ilícitas.
Na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU On-Line, a pesquisadora enfatiza que toda a radiofonia no Brasil se submete a mecanismos de controle, e isso não viola os princípios democráticos. “Considerando o fato de que o dial é limitado e que o serviço deve preservar princípios democráticos e estar a serviço das comunidades, evitando o proselitismo político e religioso, seria ingenuidade pensar a ausência de mecanismos de controle.”
A professora de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba ainda explica a confusão gerada através do uso de termos como “piratas” para designar emissoras ilegais ou comunitárias. Essas emissoras vivem hoje um cenário de conflito, e os confrontos, esclarece, se devem a disputa por “um bem escasso, um canal no dial”, o que garante para as emissoras a classificação de rádio comunitária, ou seja, o reconhecimento de atuar de forma legalizada.
Teresa Cristina Matos é graduada em Ciências Sociais, pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), mestre em Sociologia, pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal da Paraíba, com a dissertação Rádios comunitárias: memória e dádiva, e doutora em Sociologia, pela Universidade Federal do Ceará, onde produziu a tese intitulada Rádios comunitárias: sintonia dissonante e “autoimagem”.
Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como a senhora percebe a descriminalização das rádios comunitárias no Brasil?

Teresa Cristina Matos – É preciso retirar as questões referentes à radiodifusão comunitária da esfera policial e criminal para a esfera civil e administrativa. Entendo que o Projeto de Lei 4573/2009, que descriminaliza a radiodifusão sem licença (e dentro dessa definição enquadram-se principalmente rádios comunitárias), é, em grande medida, resultado de um longo processo de mobilização pelo reconhecimento do direito à comunicação não-comercial e não estatal. Do ponto de vista histórico, o processo acompanha a vida política brasileira recente, em que a busca por democratização colocou-se como uma das questões centrais durante o período da Ditadura Militar e no momento imediatamente posterior de redemocratização.
A forte mobilização de ativistas que colocaram a questão do direito a comunicação comunitária como prioritária nos anos 1990 iniciou o deslocamento do problema, colocando-o como uma questão política importante e não como uma questão policial. Por outro lado, essa mudança refletiu a efetiva realização de experiências em torno da radiodifusão não-comercial e não-estatal, naquele momento definidas por termos diversos como “popular”, “livre”, “comunitária” e “pirata” (o termo era usado então dentro do próprio movimento com um sentido de afirmação política de uma forma de comunicação libertária e transgressora).
Exemplos da experiência comunitária
Vários estados brasileiros registravam experiências bem-sucedidas de radiofonia comunitária. Em muitos casos, eram usados alto-falantes para a difusão dos programas (São Paulo e Fortaleza, registraram esses experimentos), em outros, o uso do dial dos rádios marcou o aparecimento de algumas emissoras, sendo uma das mais conhecidas a Rádio Favela, de Belo Horizonte, hoje funcionando com outorga de canal educativo. O Brasil era, até então, um dos poucos países que não haviam reconhecido o direito a radiodifusão comunitária. A Lei 9612 de 1998 tornou o serviço uma possibilidade legal, mas trouxe consigo um pacote de regulamentações muitas vezes limitantes.
É claro que dentro do ambiente de defesa de interesses, que marcou o processo de aprovação do projeto de Lei que deu vida a Lei de Radiodifusão Comunitária, uma série de medidas restritivas colocaram as emissoras numa situação de fronteira muito tênue entre a legalidade e a ilegalidade. As limitações de área de cobertura e de patrocínio são bons exemplos disto. A Lei demarcou a impossibilidade de veiculação de publicidade (fator de limitação da manutenção financeira das radicom) e a limitação do serviço a um único canal localizado no final do dial. Comparando a oferta do dial para outras modalidades de radiodifusão não comunitária, a lei estabelecia uma enorme diferença de prioridade entre comerciais e comunitárias. De lá pra cá, embora a efetivação do processo de outorga tenha sido marcado por uma morosidade enorme, ele significou uma mudança de orientação significativa. A criminalização absoluta foi dando lugar a uma possibilidade de interpretação das rádios comunitárias em seu papel social, e estabelecendo uma imagem positiva das emissoras.

IHU On-Line – Podemos tratar as rádios que não são legalizadas de rádios piratas? Qual a diferença de rádios comunitárias e rádios piratas? Segundo o projeto do governo, uma das medidas é acabar com as
rádios piratas. A senhora pode explicar as diferenças e por que existe tanta confusão quando se trata do assunto?

Teresa Cristina Matos – Em minha pesquisa de doutorado, ao reconstruir o tratamento dado pela imprensa às radiocom, bem como a forma como as próprias emissoras se autodenominavam, fui percebendo uma transformação no significado de alguns termos; assim como uma mudança na escolha das denominações usadas para definir o que hoje conhecemos como radiodifusão comunitária. A mudança revela transformações no próprio cenário da radiofonia, assim como na relação entre rádios comunitárias e rádios comerciais. Os termos são construções sociais e seus usos expressam as injunções do momento e as disputas que então ocorrem. Nos anos 1980, os jornais cearenses, por exemplo, designam as rádios não comerciais, não-estatais e não-educativas principalmente de “alternativas” e “populares”. O termo “pirata” poucas vezes era usado, e quando aparecia, enfatizava a ideia de rebeldia. Naquele momento, muitas das rádios alternativas e populares, como também se autodenominavam, operavam com serviço de alto-falantes. As matérias sobre elas dão ênfase a relação das rádios com as comunidades onde se inserem e o papel positivo que elas exercem. Nos anos 1990, quando da organização das rádios enquanto movimento social organizado e com uma demanda clara pelo direito a comunicação, se estabelecem basicamente duas denominações: comunitária e pirata. O termo rádio livre, também comum nos anos 1980, praticamente desaparece.
Diante do crescimento do número de rádios que se afirmam comunitárias, a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (ABERT) lança sucessivas campanhas publicitárias. Nelas, as rádios comunitárias sem outorga são chamadas genericamente de piratas. O termo inicialmente rechaçado passa, pouco a pouco, a fazer parte do próprio repertório das radicom, sendo usado para definir fronteiras entre “rádios verdadeiramente comunitárias” e “rádios que se dizem comunitárias”. A questão da legitimação é central aqui. Durante a pesquisa, registrei depoimentos de membros de rádios, de líderes de associações de radiocom e polêmicas em fóruns de discussão em que o termo é usado, não sem tensão, para criar demarcações dentro do próprio campo das radiocom. Hoje, há um conflito no campo da radiofonia alternativa em torno da classificação “comunitária”. Em jogo, estão um modelo diferenciado de fazer rádio e o direito a outorga como canal de radiodifusão comunitária.
Identificando uma rádio comunitária.
O barateamento dos equipamentos de radiodifusão fez surgir um enorme mercado para interessados em montar uma rádio. Esses interessados nem sempre têm ligações com o movimento de rádios comunitárias e em muitos casos não se identificam com um conjunto de princípios ligados as bandeiras históricas do movimento. A partir de 1998, assiste-se a multiplicação de denúncias de rádios que se afirmam como comunitárias, mas que são fachada para a ação de proselitismo político e religioso, ou ainda funcionam como pequenas rádios comerciais disfarçadas de rádios comunitárias. É para classificar esse tipo de emissora que o movimento de radiocom passa a usar a definição pirata.
Em síntese, podemos dizer que, depois da criação da Lei 9612/98, as rádios ganham maior visibilidade na imprensa e crescem rapidamente em número. Após um movimento de agregação de rádios de baixa potência, que visava unir forças para pressionar o Estado a reconhecer sua presença, como descrito acima, se configura um novo momento. Nele, toma a cena um movimento de legitimação, reconhecimento e diferenciação entre diferentes tipos de rádios que reivindicam a denominação “comunitária”. Assim, é num cenário de conflito e disputa por um bem escasso, um canal no dial, que o reconhecimento como rádio comunitária e a desqualificação como rádio pirata passam a ser armas na disputa pela possibilidade de fazer rádio legalmente dentro da rubrica comunitária.

IHU On-Line – Pode ocorrer uma mudança nesse cenário, a partir do projeto do governo encaminhado ao Congresso para descriminalizar rádios comunitárias ao acabar com a pena de prisão para quem for flagrado operando sem autorização?

Teresa Cristina Matos – Não sei se o fim da pena de prisão criaria um novo cenário. A dinâmica de aparecimento das rádios geralmente tem o seguinte movimento: primeiro a rádio é montada, começa a operar e em seguida, entra com o pedido de outorga. Enquanto o processo tramita, a rádio permanece no ar. É a fase de maior risco, já que, de acordo com a atual legislação, os responsáveis podem ser presos, processados e pagar multa. Além disso, a própria outorga corre risco caso sejam flagrados atuando sem permissão. Com a nova lei, os riscos diminuem para o responsável, mas a transmissão sem permissão permanece ilícita. E, se ela põe em risco a “segurança” de serviços públicos e de emergência, a pena de reclusão permanece. Acho que as rádios vão continuar aparecendo e buscando a outorga, com ou sem a mudança a aprovação das modificações na legislação vigente.
IHU On-Line – Segundo o projeto encaminhado ao Congresso, multas, apreensões de equipamentos e a suspensão do pedido de licença ainda serão mantidos. O que isso representa? De fato esse é um projeto que visa o fim da descriminalização das rádios comunitárias?

Teresa Cristina Matos – O projeto de lei aponta uma mudança de orientação importante no tratamento dado das rádios sem licença. Como já foi dito, a pessoa que coloca a rádio no ar não poderá mais ser presa ou julgada. Entretanto, o projeto mantém a ideia de que a transmissão sem autorização é ilícita. Considerando o fato de que o dial é limitado e que o serviço deve preservar princípios democráticos e estar a serviço das comunidades, evitando o proselitismo político e religioso, seria ingenuidade pensar a ausência de mecanismos de controle. Entretanto, nos 11 anos que marcam a criação da lei de radiodifusão comunitária, vários aperfeiçoamentos ocorreram. Os melhoramentos são fruto de uma enorme pressão e mobilização que o movimento de radiocom fez, usando estratégias eficientes como a articulação de parlamentares simpáticos a causa para a revisão das leis ou para forçar a criação de mecanismos para dar agilidade aos processos de outorga. A criação de Grupos de Trabalhos para pensar mecanismos, a fim de tornar menos morosos os processos de outorga, é um bom exemplo disso.
Muita coisa, é claro, pode ser melhorada. Olhando o dial brasileiro, percebe-se um claro predomínio das emissoras comerciais. Há uma ou outra emissora educativa e um ou dois canais para abarcar todas as rádios comunitárias. Não é difícil perceber que há pouco espaço para a comunicação comunitária. Outro ponto bastante delicado é o do financiamento radiocom. O modelo de apoio cultural é muito limitante para a captação de recursos, o que torna a sustentação financeira dessas emissoras precária e incerta. Considero que essa será uma das questões a ser revista a médio prazo. O atual Projeto de Lei em tramitação qualifica a veiculação de publicidade como infração, mantendo o modelo já em vigor.
IHU On-Line – A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (ABERT) disse que o projeto incentiva rádios piratas. Isso tem fundamento?

Teresa Cristina Matos – Não vejo uma relação mecânica entre uma coisa e outra. A criminalização das radiocom foi sempre uma arma discursiva usada pela Abert para desqualificar as radiocom, principalmente antes do surgimento da Lei 9612/98. Restringir o fenômeno das radiocom a uma questão meramente policial foi a estratégia usada durante muito tempo, e me parece também agora, para deslegitimar as demandas do movimento de rádios comunitárias. É claro que controle deve haver, até porque o dial não suporta a criação de emissoras para todos os interessados em montar uma rádio, mas esse controle deve ser técnico e administrativo e não policial.

IHU On-Line – A exigência pela regulamentação das emissoras de rádios locais fere os princípios da democracia?

Teresa Cristina Matos – Não acho que a simples existência de controle viole os princípios democráticos. O tipo de controle é que pode colocar em questão esses princípios. Toda a radiofonia no Brasil se submete a mecanismos de controle estabelecidos pelo Estado. Entretanto, esses não são iguais para rádios comerciais e comunitárias, por exemplo. Questões como o tipo de financiamento, o raio de cobertura e a impossibilidade de estabelecer rede entre rádios comunitárias são indicativos de diferenças que a meu ver vão ser revistas a médio e longo prazo, tornando mais democráticos os princípios de controle para os diferentes tipos de rádios.
IHU On-Line – Tendo em vista os grandes veículos midiáticos, qual é a função social das rádios comunitárias no Brasil? Em que medida elas podem contribuir para a democracia e para resgatar ou construir a auto-imagem de uma comunidade?

Teresa Cristina Matos – Uma das coisas mais interessantes que descobri na pesquisa foi o papel das rádios na vitalização do espaço público local. A vida da comunidade, do bairro passa a ser dinamizada. Esse mundo local, que pouco interessa as rádios comerciais, é a matéria-prima das radiocom. Os eventos, os problemas, as festas, as disputas ganham relevo nas ondas das radiocom. É um mundo menos homogêneo e mais rico que aparece. Nesse processo, a auto-imagem local ganha visibilidade e efervescência. É emocionante ouvir as pessoas falando sem receios de seus problemas, discutindo e encontrando soluções para as questões locais. Uma das rádios que pesquisei usou a estratégia de fazer uma parceria com uma grande rádio comercial para chamar a atenção para um problema de água e esgoto. A companhia responsável pelo serviço havia sido convidada para prestar esclarecimentos no programa da radiocom e ignorou o convite. Através da parceria com a rádio comercial, a companhia se viu obrigada a prestar os esclarecimentos. Acho que essas soluções e arranjos que tem ocorrido mostram as possibilidades das rádios comunitárias em relação ao fomento de um espaço público local ativo. Comparadas às rádios comerciais, as rádios comunitárias são um fenômeno recente, as conquistas são parte de uma história que está só começando. É certo que existem problemas, mas essa história é marcada por muitos e muitos ganhos para as comunidades em que se inserem.
IHU On-Line – Por que ainda há, na sua opinião, um limite na expansão das rádios comunitárias?

Teresa Cristina Matos – Como eu disse antes, não há espaço pra todo mundo no dial. Por conta disso há numérico um limite tanto para as rádios comerciais quanto para educativas e comunitárias. O que chama atenção é que as comunitárias são as que têm menos espaço. Um ou dois canais apenas para todas elas é de fato pouco. Mesmo que o argumento seja de que elas atuam em áreas específicas e não necessitam de um canal exclusivo, as diferenças entre o tamanho das e características das comunidades têm gerado problemas de sobreposição de estações e interferências. Acho que essa é também uma questão que a médio prazo precisará ser revista.

sexta-feira, 6 de março de 2009

MPF processa Record e Gazeta por “demonização” de religiões afro .
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William Maia

MPF processa Record e Gazeta por “demonização” de religiões afro .

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O MPF-SP (Ministério Público Federal em São Paulo) ajuizou uma ação civil pública contra a Rede Record e a TV Gazeta pedindo indenização no valor de, respectivamente , R$ 13.600.000,00 e R$ 2.424.300,00, pela suposta discriminação das religiões de origem afrobrasileira na programação das emissoras.
De acordo com a Procuradoria, programas religiosos exibidos nas redes de TV utilizam há anos expressões que discriminam religiões como umbanda e candomblé, tais como “encosto”, demônios, “espíritos imundos”, “feitiçaria”, além da famigerada “macumba”.
Para a procuradora regional dos Direitos do Cidadão Adriana da Silva Fernandes, autora da ação, as emissoras não estão imunes de responsabilidade sobre programas feitos por produtoras independentes.
“A Record e a Gazeta são responsáveis pelas ofensas às religiões de matriz africana desferidas reiteradamente pelos programas religiosos veiculados em sua grade de programação”, ressaltou Adriana Fernandes.
Em liminar, o MPF pede que as emissoras interrompam a exibição de programas que façam esse tipo de referência aos cultos de origem afro, e sugere multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento da possível decisão da Justiça. A reportagem de Última Instância procurou a Rede Record e a TV Gazeta, mas até o momento não houve resposta.
Direitos
A procuradora destaca que os referidos programas ferem direitos fundamentais, como a liberdade de crença e o “respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”.
“O abuso praticado pelas rés contraria a dignidade da pessoa humana,(...) bem como os próprios objetivos de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, ressalta Adriana da Silva.
Segundo o MPF, em abril de 2008, o Ministério das Comunicações aplicou multa de R$ 1.012,32 às duas emissoras por ofensas às religiões afro, mas na visão da procuradora, a sanção não foi suficiente para acabar com as discriminações praticadas.
Por isso pediu indenização equivalente a 1% do faturamento das empresas, que poderá ser revertido para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.
Sexta-feira, 6 de março de 2009