apoio cultural poderá ser realizado por entidades de direito privado e de direito público.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Irrma Passoni: Emissoras comerciais perdem audiência para rádios comunitárias

A ex-deputada Irma Passoni declarou ao OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA que se sente reconfortada ao ver que há reação à campanha movida por emissoras de rádio contra o que chamam de "pirataria". - Essas emissoras fazem propaganda inconstitucional, discriminatória, quando se vangloriam de usar em sua programação "linguagem do Sul", por oposição a falas de outras regiões do país. Elas já têm seu espaço, conquistadosabe-se lá como, e usam-no para criticar as rádios comunitárias, que apresentam como piratas mesmo quando sabem que não o são - disse.
Em relação aos argumentos usados, indignou-se: "Dizem que atrapalham os aviões e a polícia, que não deixam chamar a ambulância. Ora, o que atrapalha a operação dos aeroportos é a existência de rádios sem regulamentação. Mas não querem regulamentar. Quanto à polícia, não tem mais faixa exclusiva,usa qualquer faixa. Não existe mais esse problema de interferência."
A conclusão recaiu em motivações menos nobres do que o desejo de proteger o bom funcionamento dos mais relevantes serviços públicos: - Estão dizendo tudo isso para não dizer a verdade. A verdade é que não querem as rádios comunitárias, principalmente no interior do país, onde as emissoras comerciais limitam-se a retransmitir o que já vem pronto das redes,
não têm programação própria e estão perdendo audiência para as rádios comunitárias, que fazem programas locais com a linguagem própria de cada região. A Abert, no início, manifestou-se a favor das rádios comunitárias. Por escrito. Quando viu o avanço das comunitárias, mudou de posição.

Os piratas, quem diria...

Pirataria, há. Mas é de natureza mais complexa do que se imagina. Tecnicamente, "rádio pirata" é toda aquela que, sem registro junto ao governo, opera com mais de 50 watts de potência. Até essa potência, as rádios não são regulamentadas, a atividade radiofônica é livre e, portanto, não há pirataria. "Tem gente abusando", disse Irma Passoni. "Conheço o caso de uma rádio de 500watts de potência, funcionando sem autorização, que vendia 15 horas de programação para 15 pastores de uma denominação evangélica, a R$ 1.000,00 a hora. São R$ 15.000,00 mensais. Isto explica o interesse econômico por trás da atividade irregular. Há milhares de casos assim, emissoras de 300 watts, de 1.000 watts."
A ex-deputada explicou que fiscalizar é fácil e é difícil. É fácil porque é possível rastrear a localização da emissora, e tanto mais quanto maior é sua potência. Mas é difícil porque muitas emissoras piratas pertencem a  policiais federais e estaduais. Irma Passoni apontou o Ministério das Comunicações como responsável pela proliferação de emissoras irregulares. Queixou-se, mais especificamente, de integrantes de sua área jurídica que não concordaram com a outorga às delegacias locais da capacidade de fazer concessões e provocaram, por isso, o protelamento do projeto de lei regulamentando as rádios comunitárias. Ela mesma foi a autora do projeto, quando estava no Ministério, chamada, por sinal, para fazer isso mesmo. "Ficou pronta em dezembro de 95. Rolou o ano inteiro de 96 e não saiu", lamentou-se. Quem saiu foi ela. Sua proposta estabelecia o limite de 50 watts para as rádios comunitárias, definia claramente sua amplitude e quem poderia requerer a concessão. O setor jurídico baixou o limite para 10 watts. Na época, Irma declarou: ''Nas grandes cidades, a emissora só será sintonizada no raio de um quarteirão, o que dificulta até o trabalho da fiscalização do Ministério.'' Irma Passoni, hoje presidente do Instituto Internacional de Integração de Sistemas, sediado em Campinas, exerceu três mandatos federais e um estadual, em São Paulo, pelo PT. Durante um ano, presidiu a Comissão de Ciência e Tecnologia, Telecomunicações e Informática da Câmara dos Deputados. Foi relatora da CPI mista que, durante dois anos e meio, investigou as causas e dimensões do atraso tecnológico do Brasil. Teve atuação destacada na discussão da lei que regula a televisão a cabo.
Entre março de 95 e maio de 96, foi assessora especial do ministro das Comunicações, Sérgio Motta, com a tarefa de propor uma nova legislação que tornasse mais rigorosos os critérios de concessão de canais de rádio e televisão. Ao tomar posse, Motta criticara com toda clareza os métodos adotados na década de 80 para a distribuição de concessões e defendera o
"controle social dos meios de comunicação". O senador Antônio Carlos Magalhães, que, como ministro das Comunicações de José Sarney, regeu várias festanças de distribuição de concessões, retrucou pesadamente, mas o presidente da República sustentou a posição de Sérgio Motta, reiterando a crítica ao uso político das concessões. Irma Passoni tem uma visão
extremamente crítica do meio radiofônico brasileiro. - As emissoras de rádio quase nunca não promotoras da real cultura. A ética jornalística não se reflete na radiodifusão. Sem qualquer isenção,
transmitem-se opiniões juntamente com as informações. Raramente se deixa o ouvinte fazer seu próprio juízo de valor. De forma geral, o jornalismo é muito ruim, porque não visa à informação qualificada - argumentou, sem perder o fôlego. Fez apenas uma ou outra ressalva: "A CBN tem programas bons, em que se buscam várias opiniões. Há jornalistas que não fazem julgamento de
valor."

Corrupção

A ex-deputada não se surpreendeu com a revelação do esquema de venda de concessões de rádio no Ministério das Comunicações. - Desde 1962, quando foi promulgado o Código Nacional de Telecomunicações, as regras de concessão são secretas, decididas no submundo do Ministério (que era então o Conselho Nacional de Telecomunicações, Contel). Só para a televisão a cabo, agora, estabeleceram-se regras claras e públicas. O resto é mesmo na base do acerto. Sempre foi. O diagnóstico retornou ao ponto de partida, de sua partida: "O Ministério das Comunicações não se profissionalizou, sequer se informatizou. Há um poder informal instalado há décadas. Cada área da engrenagem tem dono. O ministro ou pessoas de sua confiança dificilmente conseguem controlar. Quando eu estava lá, propus que as concessões fossem atribuídas por uma comissão ampla, representativa da sociedade, que poderia, assim, impor regras. Não consegui.
Aliás, foi por isso que eu saí."

(Entrevista concedida a Mauro Malin.)